Carta da Terra

"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)

REDD ( REDUÇÃO DE EMISSÕES POR DESMATAMENTO E DEGRADAÇÃO ) É UMA FORMA EFICIENTE DE REDUZIR EMISSÕES /// Carbono Brasil

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Autor: Fernanda B. Muller - Fonte: CarbonoBrasil

O gerente de estratégias no Brasil da The Nature Conservancy, Diogo Rossi, fala sobre o potencial do mecanismo de REDD de trazer recursos para proteger as florestas e a biodiversidade e também sobre os projetos da ONG

Muito se discute sobre os projetos de redução das emissões por desmatamento e degradação (REDD) e como eles deveriam ser postos em prática. Questões como se deve ser um mecanismo governamental ou uma ferramenta de mercado ainda não estão claras. Também é incerto se o REDD cumpriria sua função para reduzir as emissões de gases do efeito estufa.

Para tentar esclarecer essas dúvidas, a CarbonoBrasil conversou com Diogo Rossi, gerente de estratégias no Brasil da ONG The Nature Conservancy, que defendeu o mecanismo como sendo talvez a forma mais eficiente e a um custo mais baixo de reduzir em muito as emissões. Além disso, ele falou que REDD não se resume a carbono, mas traz também outros benefícios como proteger a biodiversidade, ajudar a aliviar a pobreza e manter florestas em pé.

CB: Como a TNC enxerga que o REDD funcionará, será uma ferramenta de mercado ou será um mecanismo governamental?

DR: Temos participado de diversos debates, o que temos visto e o que parece fazer mais sentido é uma posição mista onde o governo tem um papel, mas as empresas também participam. Esta é uma opinião minha, não uma posição da TNC.

Estamos falando de áreas enormes, então num pool de grandes extensões você vai ter ações que devem ser feitas pelo governo federal, estadual, mas também vai ter ações que são feitas a nível de projetos. Aí será necessário um sistema para contabilizar isto tudo, de acordo com as iniciativas você pode calcular quanto que veio de redução de um monitoramento maior (a nível estadual). Estou colocando aí um modelo de REDD onde todos estão conversando numa boa, bem transparente, a ciência existe hoje para fazer um mecanismo neste sentido.

CB: Parece um mecanismo complexo, com esta quantidade de atores.

DR: Sim é complexo e ao mesmo tempo é aí que entram também as grandes empresas, o que de certo modo é criticado por muitos. O REDD seja talvez a forma mais eficiente e a um custo mais baixo de reduzir em muito as emissões (de gases do efeito estufa). Alguns vão estar compensando, mas a nível global você estará reduzindo as emissões. Porque como é um problema global temos que lidar sempre com este ponto de vista. Então, o país está compensando as suas atividades e continua emitindo, mas é aquela coisa do mundo ideal versus o real. Precisamos de soluções à curto prazo.

CB: No Carbon Market Americas, o Edwin Aalders (ex-diretor da Associação Internacional de Comércio de Emissões) comentou que como o REDD está colocado agora não existem incentivos para os investidores privados entrarem neste mercado e que o pouco volume de demanda que existe é deles ‘testando’ o mercado, você concorda?

DR: É interessante, por que por incrível que pareça tem compradores de REDD. Mas a minha leitura é essa também. Hoje tive uma ligação com uma destas empresas globais de consultoria, ou seja, todo mundo está ouvindo falar de REDD. Só que os investidores mais sérios têm tanta coisa para esclarecer, que o risco ainda é muito alto. O que estamos vendo é que hoje há espaço sim para aquelas empresas e investidores em busca de ‘early action’ (ações antecipadas) e como tudo no mercado, um maior risco talvez tenha um maior retorno ou retorno algum. Agora o mercado ainda não está muito formado por que existe uma série de questões, por exemplo, como você lida com a repartição dos benefícios de forma que chegue às populações mais pobres, tradicionais e indígenas.

E ao mesmo tem uma série de governos, por exemplo, esta iniciativa Paris-Oslo (de debates), que estão comprometendo US$ 6,5 bilhões nos próximos três anos. Então, no horizonte mais de curto prazo destes próximos três anos serão os governos envolvidos com ‘readiness’ (preparação para o REDD), criando o marco regulatório e projetos pilotos.

CB: Então você acredita que o REDD seja um mecanismo efetivo para proteger as florestas e os povos indígenas e tradicionais?

DR: Acredito e acho que tem tudo para ser o mecanismo, talvez não o único. Não só pelo carbono, mas por todos os benefícios extras, por proteger a biodiversidade, ajudar a aliviar a pobreza e manter florestas em pé.

CB: A TNC tem projetos bem diferentes relacionados ao REDD, tanto os do PA e MT com cadastramento rural que servirá como uma base para o governo quanto os projetos de Guaraqueçaba que foram baseados em compromissos de empresas, você poderia falar um pouco sobre estas diferentes experiências? Qual é mais efetiva?

O projeto de Guaraqueçaba tem dez anos e é piloto e tem muita coisa que continuamos discutindo, se imaginar hoje e dez anos atrás, era outro momento mesmo. O modelo lá foi baseado na compra de terras e gestão da área, boa parte já foi transformada em RPPN e gerou muitas lições aprendidas. Hoje acreditamos que para ter escala, o modelo onde uma ONG compra a área não tem como ter grande escala. Nisso veio a idéia de trabalhar com o arcabouço legal que temos no Brasil que é o Código Florestal. Então se levarmos em conta todo o déficit que temos de reserva legal, só em SP apenas o setor de cana tem um déficit de 500 mil hectares. Então a abordagem nos projetos do PA e MT é focar na regularização da legislação, onde o carbono é um incentivo adicional ao cumprimento do código florestal, conseguindo uma escala maior.

Outro projeto envolvendo o carbono no Brasil é o do Corredor Ecológico Monte Pascoal-Pau Brasil, em parceria com o Ibio, o primeiro de reflorestamento certificado com o padrão CCBA no Brasil. É um projeto que começou pequeno com uma neutralização para um evento de uma regata e a idéia de provar um conceito, de trazer recurso do carbono para restauração de reserva legal. Então o primeiro projeto foi com a Kraft e já aumentou bastante a área porque depois veio a Natura comprando o carbono e a Coelba (empresa de energia da Bahia). Tudo resultado de neutralização de emissões.

CB: O conceito de trabalho com as empresas é parecido com Guaraqueçada, mas vocês aprenderam que o ideal é não comprar a área...

DR: Exatamente, por que o custo de restauração na Mata Atlântica, que tem uma biodiversidade enorme já é alto e se envolver compra e gestão de área fica realmente inviável. Trabalhando dentro de reserva legal, e hoje estamos até mesmo priorizando as áreas de preservação permanente, temos uma garantia a mais de permanência. Aí entra parcerias com as secretarias ambientais dos estados.

Temos também os projetos em São Paulo, na região de abastecimento da cidade na Cantareira . O conceito é carbono e água com recursos do comitê, da cobrança pela água que paga parte dos Serviços Ambientais e o carbono entra para pagar a parte de restauração. Tem um pool de projetos nesta área, com a Sabesp, com a 3M e outros demonstrando este tipo de conceito.

Tem também os projetos piloto de REDD, no noroeste do Mato Grosso e no Pará, este último ligado com comunidades indígenas.

CB: Dizem que projetos de REDD e Mata Atlântica não combinam, que não tem como desenvolver estes projetos neste bioma, você concorda?

DR: É que hoje já cortaram tudo na Mata Atlântica e estão indo pra Amazônia e Cerrado.

CB: Mas este não seria exatamente um motivo para focar nela? Apenas restam 7% desse bioma, o que já é pouco e se formos considerar que grande parte destes estão sendo degradados, sobra ainda menos.

DR: Esta é a questão, se a tecnologia evoluir e surgirem técnicas de análise de degradação... hoje é muito mais fácil de enxergar e fazer linha de base de desmatamento. O dia que tivermos uma tecnologia para monitorar a degradação, então isto pode mudar. Como é um mecanismo de mercado, entra a lógica econômica de provar o que está acontecendo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário


Informação & Conhecimento