Carta da Terra

"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)

Povos e jovens indígenas/// PRVL

PRVL significa Programa de Redução da Violencia Letal contra Adolescentes e Jovens






link:     http://prvl.org.br/destaque/339/

Já não bastassem os desafios que os adolescentes e jovens brasileiros têm que driblar diariamente, a juventude indígena encara ainda problemas que minam suas perspectivas de vida, como altos índices de suicídio, obstáculos à promoção da identidade e da tradição de suas comunidades, dificuldade de acesso à saúde e impasses lingüísticos, econômicos e culturais. Esse é o quadro apontado pelo estudo “A situação dos povos indígenas no mundo”, lançado pela ONU em janeiro.

O relatório, disponibilizado apenas em inglês, apresenta um panorama das condições de vida e sobrevivência das tribos indígenas em diversos países, inclusive no Brasil. Escrita por peritos independentes – especialistas em temáticas indígenas ligadas a áreas como direitos humanos, educação, saúde, meio ambiente, entre outras – a publicação revela que 38% dos 750 mil índios brasileiros vivem em situação de extrema pobreza.

Link para o relatório: http://www.un.org//esa/socdev/unpfii/documents/SOWIP_web.pdf

Em relação aos números mundiais, as taxas de pobreza também são alarmantes: há 300 milhões de indígenas miseráveis dentro do total dos 370 milhões de índios que ainda vivem no mundo. Esses povos representam mais de um terço das 900 milhões de pessoas que vivem na miséria em áreas rurais do planeta.

Alguns agravantes revelados pela ONU são os altos níveis de mortalidade infantil, desnutrição, HIV/Aids, violência, políticas de assimilação e desapropriação de terras, marginalização e abusos de forças militares, injustiças que atingem índios de todas as idades, mas muito intensamente a vida de crianças, adolescentes e jovens. Os jovens parecem ser os que mais sofrem com racismo, discriminação e ausência de recursos básicos de sobrevivência.

Um dos principais pontos levantados pelo estudo é a falta de mecanismos judiciais que defendam a diversidade das trajetórias comunitárias e lingüísticas dos índios e as garantias ambientais, tal como o direito à demarcação territorial de seus espaços de moradia. A relação com a terra, que passa necessariamente por uma conexão espiritual e cultural e vai muito além de questões de mera posse econômica, não é laveda em consideração pelas políticas voltadas aos indígenas. É o que explica o articulador dos direitos dos índios no Comitê Intertribal – Memória e Ciência Indígena (ITC), Marcos Terena, ao comentar a pesquisa da ONU. “Se os povos indígenas têm um território demarcado e garantido, isso gera tranqüilidade para a tribo e para os que vivem ao redor dela. Apesar de alguns avanços nesse campo no Brasil, o sistema jurídico ainda não faz uma análise da lei costumeira indígena, onde cada comunidade interpreta de forma particulare o que seja a idéia de direito, de propriedade. Ignorar essas singularidades gera uma agressão aos princípios dos direitos humanos, do direito à vida, já que, sem terra, não há vida para os indígenas”, sustenta Terena.

Terena também afirma que a situação do Brasil ainda é um pouco melhor do que a de demais países da América Latina, pois aqui existem leis que contemplam a questão indígena e já se conta com um avanço no processo de demarcação de terras. Mas ainda há pela frente um grande caminho, onde não faltam contradições. De acordo com o articulador do ITC, a Lei do Índio de 1973 – que considera o índio incapaz, colocando-o sob um regime tutelar, pelo qual ele não é investido de plenitude da capacidade civil – e a Constituição de 1988 – que reconhece a participação indígena na nação, e trata a cultura indígena dentro de um parâmetro de direito à diversidade – mostram-se divergentes em muitos tópicos. “Não há uma doutrina indigenista. Não há entre os profissionais do Direito uma escola de formação voltada essencialmente para a interpretação dos quadros indígenas brasileiros”, explica Terena.

Jovens indígenas: entre suicídio e formas de valorização da vida
O relatório da ONU mostra a gravidade que ronda a expectativa de vida dos povos indígenas e ressalta o fenômeno do suicídio, que atinge algumas aldeias e está relacionado à realocação das comunidades indígenas de suas terras, territórios e recursos. No Brasil, segundo o documento, os índios Kaiowa, que juntos somam cerca de 30 mil, viram nas duas últimas décadas centenas de jovens da comunidade tirarem as próprias vidas, enquanto a tribo lutava para manter os madeireiros e os fazendeiros longe de suas terras.

Retomando dados do Ministério da Saúde, o estudo da ONU também ressalta que, entre 2000 e 2005, a taxa de suicídio em duas comunidades Guaranis foi duas vezes maior do que a taxa nacional, destacando que esta forma de letalidade afeta desproporcionalmente os adolescentes e os jovens adultos Guaranis.

O suicídio é um dos entraves mais dramáticos à valorização da vida nas comunidades indígenas e, segundo Terena, costuma ser um desdobramento da falta de perspectiva que assombra especialmente os jovens. “A ansiedade psicológica e econômica se agrava quando o jovem não tem perspectiva, quando, por exemplo, a demarcação da sua terra não está garantida. Além do suicídio, surgem outros riscos, como risco das drogas, que vem crescendo nas aldeias, e do alcoolismo. Outro problema é que o HIV está chegando cada vez mais a essas comunidades, afetando o equilíbrio familiar”, denuncia Terena. O articulador do Comitê Intertribal ainda destaca a fragilidade da constituição de direitos humanos voltados para os indígenas: “Quando se fala em direitos humanos parece que os índios só aparecem quando morrem, mas eles vêm morrendo lentamente. Ainda faltam muitas iniciativas para que as ações em direitos humanos acompanhem efetivamente o direito à vida dos índios e os desafios que as aldeias enfrentam”.

Algumas alternativas ao quadro apresentado pelo relatório da ONU estão sendo traçadas no Brasil há alguns anos, conforme afirma Marcos Terena. Uma delas são os Jogos dos Povos Indígenas, que estão na sétima edição. Resultado de uma articulação entre o Comitê Intertribal e o Ministério dos Esportes, os jogos reuniram cerca de 60 etnias indígenas no ano passado. “É uma semana na qual os índios gastam suas energias, em atividades de afirmação identitária, Os jogos promovem um circuito de relacionamentos muito positivo”, comenta Terena.

O relatório da ONU apontou também problemas ligados à educação das crianças, adolescentes e jovens de sociedades indígenas. No caso do Brasil, esses índios muitas vezes têm interesse em aprender a Língua Portuguesa falada e escrita e em manter a tradição de suas línguas locais, que geralmente são orais, mas, conforme explica Marcos Terena, mais um obstáculo aparece na vida desses jovens: a ausência de políticas públicas que promovam uma educação bilíngüe.

O indígena Auakamu, da aldeia Kamayurá, do Parque Indigena do Xingu, Mato Grosso, ressalta mais esta deficiência do ensino no país. Com 19 anos, filho e neto de caciques, Auakamu mudou-se para Brasília, onde completou o ensino médio e trabalha como assistente cultural no Comitê Intertribal. O jovem agora almeja ingressar no curso da Pedagogia para contribuir na educação de sua comunidade. “Na aldeia tem muita gente querendo estudar e precisamos de pessoas que estudem na cidade, mas queiram voltar para dar aula na aldeia, porque não temos gente para ensinar. Vim para Brasília estudar e quero voltar e ensinar para as crianças de lá. Também pretendo ser cacique. Meu avô me ensinou muitas coisas e hoje também vejo como o meu pai cuida das pessoas na aldeia A ideia é juntar os dois conhecimentos”, afirma o estudante.

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