Carta da Terra

"Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio da uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações." (da CARTA DA TERRA)

A DECOLAGEM DO BRASIL /// The Economist

Chegando lá, finalmente.

John Prideaux , The Economist
O Brasil sempre foi conhecido como o país do “grande potencial”.Uma nação que possui as maiores reservas de água, as maiores florestas tropicais, a terra é tão fértil que em algumas fazendas rendem até 3 colheitas por ano, além da pujante diversidade mineral e riqueza em petróleo.

Muitos investidores estrangeiros têm apostado fortunas na idéia de que o Brasil é realmente o país do futuro e muitos deles têm perdido tudo. Houve o caso de Henry Ford que, visionário, investiu pesado na Amazônia, plantando uma floresta para extração de borracha que serviria para fabricação de pneus. Chegou a ser conhecida como Fordlandia, um longínquo município no estado do Pará, hoje sendo engolido pela densa e crescente floresta. Foi um projeto emblemático que representou o triunfo da experiência sobre a esperança.

Os estrangeiros têm memória curta. Quanto aos brasileiros, estes aprenderam a dosar o seu otimismo com precaução, mesmo neste momento em que o país provavelmente encontra-se  aproveitando o seu melhor momento desde o descobrimento pelos portugueses (que procuravam pelas Índias, e acabaram por aportar aqui) no ano de 1500.

Ao longo de sua história o Brasil já foi uma democracia, já teve crescimento econômico e também já teve inflação baixa. Mas, nunca conseguiu sustentar estes três pilares de forma simultânea, como o faz hoje.
Se as atuais tendências se mantiverem (e a condicionante “se” é muito relevante) o país que hoje apresenta 192 milhões de habitantes e em crescimento acelerado, poderá vir a ser uma das 5 maiores economias ainda na metade deste século, ao lado de China, EUA, Índia e Japão.

Apesar da grande crise financeira que chacoalhou todo o mundo, muitas coisas boas parecem ter acontecido por aqui neste momento. A auto-suficiência no petróleo, com grandes descobertas de reservas de óleo na costa brasileira em 2007, poderão alçar o Brasil ao status de país exportador de petróleo ainda no final da próxima década. As 3 principais agencias de “rating” classificam os títulos do Brasil como sendo “investment grade”,o que é muito positivo para sua economia.

O governo anunciou que emprestará dinheiro ao FMI, instituição que até recentemente, uma década atrás, impunha condições para emprestar dinheiro ao país.

No ultimo ano, 2009,o inverno da crise financeira tem se apresentado maior para as economias de alguns países e assim o chamado "investimento direto estrangeiro" (FDI-foreign direct investment) rumou para o Brasil o que representou um crescimento de 30% em relação aos aportes do ano anterior. Enquanto que no mesmo período o FDI encolheu em 14% no resto do mundo.
Muito do atual sucesso do Brasil se deve ao governo anterior, em particular o de Fernando Henrique entre os anos 1995 e 2003, o qual criou um ambiente macroeconômico estável e previsível (sem surpresas),onde os negócios encontraram solo fértil para florescer (embora até hoje o governo interferira de forma direta na política empresarial)

Mas, como esta admirável transformação se deu? E como as empresas brasileiras e estrangeiras, de diferentes portes, poderão usufruir desta nova estabilidade nacional?

Para entender porque o Brasil parece ser tão atrativo tanto para brasileiros quanto para estrangeiros, olhar para a crise econômica brasileira do inicio da década de 90 é uma boa opção. Os desapontamentos sofridos naqueles anos levaram o país a incorporar alguns importantes fatores que os estrangeiros não conseguem entender muito claramente. São 3 estes fatores: (i) uma grande desconfiança pelo conceito de livre-mercado;(ii) a crença de que o governo (banco central) sabia o que fazia quando interferia nos negócios e finanças e, (iii) a persistente manutenção de juros em altos patamares.

Quando o Brasil tornou-se independente de Portugal , em 1822, tornou-se um grande mercado emergente, com demanda reprimida, e desta forma chamou a atenção dos estrangeiros. Os ingleses, por exemplo, inundaram o país com seus produtos, inéditos para um mercado até então fechado e ansioso por atualizar-se.Há uma famosa estória que reporta sobre a aquisição de patins para esquiar no gelo....num pais tropical. Apenas para ilustrar a febre pela qual o país passou naquele momento.

No entanto a renda per capita do país manteve-se estagnada por todo o século 19, talvez por motivos relacionados á um sistema educacional inadequado e uma economia atrelada á produção escrava de commodities para exportação como política de desenvolvimento.
Desde então os brasileiros tendem a olhar para livre comércio com desconfiança, apesar do recente sucesso do país como um grande exportador

Na metade do século 20, o Brasil, aparentemente encontrou uma formula para estimular seu crescimento e usufruir daquilo que se conheceu por “ milagre econômico”.Por um momento sua economia cresceu mais rápido que outros grandes países como Japão e Coréia do Sul.

Este crescimento se deu por conta de um modelo de desenvolvimento orientado por um organismo de Estado presente, financiado pelo endividamento externo e com uma economia semi-aberta (reservas de mercado).
Mas com este o crescimento veio também a inflação que assolou o país até a metade dos anos 90, cujas reminiscências se manifestam até os dias de hoje; a altíssima taxa de juros praticada pelos bancos internamente no país e um desinteresse generalizado pelo conceito de “poupança”, são algumas delas. Ao mesmo tempo o “milagre econômico” realizado pelo governo militar trouxe aos brasileiros a sensação de que o estado sabia o que estava fazendo, pelo menos em termos de Economia. E o cenário que se seguiu depois do governo militar não mudou esta noção.


Infelizes Memórias

Quando o modelo desenvolvimentista dos anos 70 implodiu com a crise do petróleo, o país encontrou-se numa terrível inflação e tendo que conviver com uma dívida externa gigantesca.

Duas décadas se passaram e o Brasil começou a parecer mais com a Nigéria do que com a Coréia do Sul. A produtividade cresceu de forma contrária. Muitos dos atuais problemas, incluindo crimes, sistemas de educação e saúde inadequados e falhos são conseqüências daquele período ou foram agravados por ele. Entre os anos 1990 1995 a inflação media era de 764% ao ano.

Foi então que um milagre real aconteceu. Uma equipe de economistas liderada pelo então ministro da fazenda Henrique Cardoso, introduziu uma nova moeda chamada “Real”, a qual se estabeleceu de modo firme onde as anteriores todas haviam falhado.
Em apenas um ano de Plano Real os preços estavam sob controle. No ano de 1999 a taxa do cambio que então era indexada foi trocada pela “livre flutuação”, e o Banco central definiu formalmente limites para a inflação. Dez anos se passaram desde este evento e até hoje se discute sobre como tornar o Real menos volátil. Hoje nenhum partido político defende o retorno à “taxa de cambio indexada”.

O mais importante é que esta reforma trouxe disciplina para as finanças do governo. Hoje tanto o governo federal quanto o estadual tem que viver com seus próprios recursos. Uma exigência de geração de um superávit primário (antes do pagamento de dos juros da divida publica) foi incorporada no ano de 1999 e desde então o governo tem realizado esta meta.Isto ajudou para que o Brasil tenha se livrado de seu endividamento externo em dólar, fato que o perseguia em todo momento de crise financeira,fosse interna ou externa.
Nos dias de hoje as instituições internacionais de crédito olham para o governo brasileiro com outros olhos no que diz respeito á honrar seus compromissos financeiros. A agencia Moody´s,de classificação de crédito(rating), elevou os títulos do governo brasileiro ao status de “investment grade”, igual ao países desenvolvidos.

No entanto, o crescimento ainda não é fácil. A economia mundial é muito flutuante e conseguir um aumento de preços nas commodities é algo pouco provável, principalmente neste momento. Embora a economia do Brasil ainda seja relativamente fechada (o comercio externo representou modestos 24% do PIB em 2008, menos que em 60 anos atrás), o seu crescimento está intimamente correlacionado as preços das commodities, da economia chinesa, do índice Baltic Dry e de outros indicadores de comércio global . Mas, finalmente, em 2006, o crescimento do PIB ultrapassou a inflação pela primeira vez em mais de 50 anos.

O legado do sortudo Lula

O atual presidente Lula sido creditado pela maior parte deste crescimento, mas muito dele pertence ao seu antecessor.
O grande trabalho de Lula tem sido em manter as reformas que foram definidas no governo anterior sendo que na realidade pouco fez em seu governo. O que não significa uma tarefa simples, uma vez que o seu partido tem tentado literalmente arrastá-lo para uma posição política mais á esquerda

Lula normalmente inicia seus discursos com a fala: “nunca antes na história deste país….”; o que enraivece seus adversários políticos porque apesar de tudo, se trata de uma verdade. O Brasil conseguiu reduzir suas taxas de juros e ainda injetar dinheiro na economia, enquanto o mundo estava em plena crise. Pela primeira vez o país conseguiu fazer isto em plena crise mundial e por conta própria.

Enquanto todos prediziam que os eventos econômicos globais arrastariam o Brasil para o fundo do poço, o presidente Lula declarava que esta crise representaria apenas uma “marola” para a economia nacional. E realmente assim aconteceu, a economia encolheu apenas 50% naquele período e agora já retomou o crescimento. Uma posição completamente inversa quando comparado ás crises anteriores. (veja o Artigo).

Muitos problemas ainda permanecem. A taxa de juros do banco central ainda é de 8,75%, uma das maiores taxas reais em qualquer lugar do mundo. O que torna os empréstimos a longo prazo na sua própria moeda, soluções extremamente dispendiosas para o governo.

A produtividade em geral ainda é muito baixa, reflexo de diversos motivos. Em São Paulo, a maior cidade do país,as dificuldades de transportes públicos são gritantes; as vezes o deslocamento de um trabalhador que mora na periferia da cidade até o seu serviço leva 2 horas e neste meio tempo ainda corre o risco de ser assaltado.Isto implica em cansaço adicional o que o torna incapaz de desenvolver o seu trabalho com toda sua plenitude e energia.

O governo investe pouco e as lacunas em policiamento e segurança, assim como em educação são enormes. Complementarmente o seu sistema legislativo está defasado, entre outras dificuldades.

Enquanto outras nações passam por dificuldades semelhantes o Brasil consegue progressos concretos.Num país onde até recentemente a taxa de juros era de 30% ou mais e em um curto espaço de tempo diminuir para menos de 9% representa um grande alivio para todos; “ é como a diferença em correr uma maratona com 50 kgs ou 20 kgs a mais nos ombros”, ilustra um executivo do mercado financeiro local; Luis Stuhlberger do Credit Suisse Hedging-Griffo. Luis sustenta que o passado recente do país não foi nada bom e que a expansão em educação e em acesso ao crédito ainda são fatos muito recentes e que desta forma é bastante plausível esperar que o país continue nesta trajetória sem grandes mudanças.

Por conta disto, ele argumenta, "não teremos uma Harvard ou uma Google aqui." A culpa por isso, diz ele, encontra-se em grande parte com as políticas do governo.
A trajetória econômica do Brasil certamente poderia ser mais excitante com a adoção de algumas reformas em seu ambiente econômico e financeiro.

O potencial do crescimento interno sem risco de superaquecimento e subseqüente risco inflacionário é até o patamar de 6,8%. Isto é o que foi atingido no terceiro trimestre do ano de 2008. Embora a maioria dos economistas situa este patamar em 4-5%. O que sugere que em curto prazo, os juros não baixarão para patamares considerados normais em outros países.

Entretanto, a estabilidade economica trouxe suas próprias recompensas. Edmar Bacha um dos economistas responsáveis pela introdução do Plano real em 1994, comenta com satisfação que hoje a discussão sobre economia no Brasil resume-se á poucos tópicos. Quando era ministro da fazenda em 1993, a inflação era de 2.489% ao ano. Atualmente, ele observa com um sorriso, "os grandes debates são sobre se as taxas de juros poderiam baixar de 8,75% para 8,25%, ou se o Banco Central deveria ter realizado um mês antes aquela tal redução."
Essa mudança foi boa para o Brasil, e particularmente boa para seus bancos e seu sistema financeiro.

Leia o artigo em Ingles: http://www.economist.com/opinion/displaystory.cfm?story_id=14829485

Tradução de Laércio Bruno Filho

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